sábado, 5 de fevereiro de 2011

AS AVENTURAS DE DJÔNI RÓTEN - Parte I



Seu nome é Djôni Róten Santos da Silva, e a culpa disso é do seu pai, do álcool e do punk rock, não necessariamente nessa mesma ordem. A mãe dele não teve nada a ver com isso. Ela não gostou, a princípio. Mas, na época em que o nome foi escolhido, ela estava gorda e grávida demais para se preocupar com esses detalhes.

Djôni é adolescente e é noite de sexta-feira, o que significa que ele ambiciona se divertir. Para seu azar, isso não deve acontecer. O fato de ter apenas dez reais no bolso é o menor de seus problemas. Por inverossímil que pareça, Djôni tem mais dinheiro do que opções para gastá-lo. O garoto mora numa cidade com menos de seis mil habitantes, uma cidade menor do que alguns shoppings da capital, uma cidade na qual é difícil até fazer uma refeição fora de casa depois que o Jornal Nacional termina - imagine então para encontrar uma opção de "vida noturna".

Djôni recorre ao Twitter para saber o que os amigos estão fazendo. Pablo está passando o mês na praia com os pais (e com a irmã mais velha, a mais gostosa de todas as irmãs gostosas do mundo). João (alcunhas "Bola", "João Gordo", "Porcão"), o gordo da turma, estava num churrasco em outra cidade. "Que saco, o Bola sempre tem um churrasco", reclamou Djôni para seus botões. Rômulo estava tocando com a sua banda horrível num bar podrérrimo a trinta quilômetros dali.

A conclusão era inevitável: com toda a Trupe Maldita indisponível, a noite seria um tédio. Internet, ouvir um pouco de música, terminar de ler a última revista do Homem-Aranha, entornar um copão de Nescau na cozinha (sem a mãe ver, de preferência) e ir dormir. "Uau", pensou Djôni, "como é bom ter dezesseis anos!".

Os pensamentos de Djôni são interrompidos pelo toque irritante de seu celular. Um celular velho e barato, pois os pais de Djôni achavam que ele não precisava ter um smartphone - e sem dúvida estavam certos quanto a isso. Ao olhar para a tela do aparelho, Djôni se vê surpreso ao ler a palavra "Porcão" piscando nela.

- Alô, Porcão?

- Fala, DJ!

Djôni odeia ser chamado de "DJ". Não dá para condená-lo por isso. Qualquer coisa associada à música eletrônica é uma ofensa mortal para um metaleiro, e Djôni é um metaleiro "true" - o que basicamente significa que ele só gosta de Iron Maiden.

- Achei que você estava num churrasco.

- Saí de lá há quarenta e cinco minutos. Você não checa há quanto tempo uma mensagem foi postada quando lê ela no Twitter, cabeção?

- Pior.

- O quê é "pior" do que o quê?

- Pior, pô. Forma de se expressar. "Pior que é", "pior que é verdade" ...

- Ah, tá, entendi. Vem cá, vai fazer alguma coisa hoje de noite?

- Acho que não, todo mundo está na praia ou enchendo o rabo de carne em churrascos.

- Nem me fala, comi feito um porco.

- Não te chamam assim por nada, né?

- Pelo menos eu não sou Díd-Jêi de festa Guêi!

- Dã, que engraçado.

- Hilário, na verdade. Mas afinal, quer sair hoje ou não, animal?

- Sair pra onde?

- Podíamos ir no show da banda do Rômulo.

- Bah, me desculpe, mas a "Reciclators" é a pior banda do mundo.

- Rárá, são ruins demais, e o Rômulo é o pior de todos. Mas eu quero ir. Acho que vão atirar garrafas de cerveja neles. Se ninguém tomar a iniciativa, eu atiro a primeira.

- Quanto é pra entrar nessa bosta desse lugar onde eles vão tocar?

- A consumação é cinco pilas e não pedem identidade.

- Bom, vamos ir, é melhor do que nada.

- Passo aí pra te pegar em dez minutos.

O Bola se despede e desliga. Ele é um pouco mais velho do que Djôni, mas ainda não fez dezoito anos. Mesmo assim, o pai dele costuma liberar o carro de noite, nos fins de semana. O fato de dirigir consolidou o Bola como uma presença obrigatória em todos os planos do grupo, incluindo aquelas coisas para as quais ele não costumava ser convidado, como se reunir na casa de alguém para rachar uma pizza, por exemplo.

Djôni se prepara para sair. Calça jeans, camiseta do Iron Maiden, celular, os dez reais, carteira de identidade (melhor prevenir do que se estrepar, ele pensa), desodorante, um punhado de gel no cabelo e, três minutos e meio depois, ele está pronto para esperar pelo Bola na frente de casa.

Quando o Bola chega, Djôni já começa a reclamar.

- Droga, começou a chover.

- Percebi, não sou cego.

- Mas é retardado. Caso contrário, não estaria pegando a estrada para ir ver a Reciclators tocar em outra cidade.

- O que mais nos resta? Já comi o suficiente por hoje, e ir beber no cemitério já cansou.

- Tá louco, ainda mais com essa chuva.

- Sem falar que não tem mulher no cemitério.

- Até tem, mas estão todas mortas. E isso não é argumento, porque lá no show do Rômulo não vai ter mulher também.

- Vai ter uma, pelo menos. A Kátia.

- Quem é essa?

- A Kátia, a baixista.

- Eles arranjaram um baixista?

- Não, imbecil, eles arranjaram um tocador de piano e um violinista. Claro que arranjaram um baixista, animal! Onde é que já se viu banda de rock sem baixista?

- Os Rolling Stones não tem baixista.

- Claro que tem. No estúdio tem e ao vivo tem, só não tem um único baixista como membro efetivo da banda. Meu Deus, DJ, como tu é burro!

- Cuida pra não bater esse carro.

- Essa chuvinha de merda não é nada pra mim. Tenho experiência em dirigir com mau tempo.

- Certo, como naquela vez em que tu deu uma ré e caiu com o carro na vala, né?

- O mecânico falou que foi um problema no freio de mão.

- Ele disse isso só pro teu pai não te matar ali mesmo.

- É possível.

Vinte e cinco minutos depois, Djôni e Porcão estacionam na frente de um bar. As ruas estão desertas e chove aos cântaros.

- "Alley"? Nunca ouvi falar - diz Djôni.

- É porque o lugar é uma bosta mesmo - responde Porcão.

- Voto de ficarmos no carro ouvindo música.

- Não rola. O som está estragado. Ah, e tem mais uma coisa ...

- O que?

- Eu preciso peidar.

- Tá certo, me convenceu, vamos descer.


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