terça-feira, 14 de agosto de 2018

O Caveira resenha: STAR WARS - AFTERMATH ("Marcas da Guerra"), de Chuck Wendig (2015)




Como todo fã de Star Wars já sabe, na esteira da aquisição da Lucasfilm pela Disney em 2012, o conglomerado de Mickey & Cia declarou (mais precisamente em 2014) que todo o vasto Universo Expandido (ou seja, todas as tramas e histórias de Star Wars construídas ao longo das décadas fora das telas do cinema, seja em livros, videogames, HQs, etc) perderia o status de material canônico da franquia e passaria a existir sob o novo nome de Star Wars Legends. Em outras palavras, tudo aquilo que antes era considerado uma extensão enriquecedora do universo cinemático de Star Wars passou, a partir de 2014, a existir na forma de mera curiosidade artística, como "lendas" - ou seja, como histórias alternativas.

Uma das consequências mais dramáticas desta decisão é que os livros conhecidos como Trilogia Thrawn, de autoria de Timothy Zahn, deixaram de ser canônicos. Lançados entre 1991 e 1993, durante mais de vinte anos estes três livros se converteram em objeto de adoração dos fãs de Star Wars porque gozavam da distinção de representar o que de mais próximo se poderia chamar de uma continuação da clássica trilogia dos filmes lançados entre 1978 e 1983.

Estes livros ("Hair of the Empire", "Dark Force Rising" e "The Last Command") eram, portanto, essencialmente a resposta para a pergunta "o que aconteceu lá naquela galáxia muito, muito distante depois do fim de O Retorno de Jedi?".  


Com o anúncio do tão aguardado Episódio VII nos cinemas (que viria a ser lançado em dezembro de 2015) e a "expulsão" da Trilogia Thrawn dos cânones de Star Wars, restava um "buraco negro" cronológico-narrativo de mais de vinte anos entre os fatos mostrados nos final de "O Retorno de Jedi" e o início do Episódio VII ("O Despertar da Força"). E é exatamente aí que entra a nova trilogia "Aftermath", de autoria de Chuck Wendig, cujo primeiro livro é justamente "Aftermath" (ou "Marcas da Guerra", aqui no Brasil).

Lançado em setembro de 2015, no clima de expectativa e preparação para o lançamento do Episódio VII nos cinemas, "Aftermath" não chegou a ser o primeiro livro do novo universo literário canônico de Star Wars pós-2014. Essa honra coube a Star Wars: A New Dawn, lançado ainda em 2014 e de autoria de John Jackson Miller (autor de "Kenobi", recentemente resenhado aqui na Cripta). 


Mas "Aftermath" carrega consigo uma honra muito maior: assumindo o lugar que outrora perteneceu à cultuada Trilogia Thrawn de Timothy Zahn, "Aftermath" dá o pontapé inicial em uma nova trilogia de livros que faz a "ponte" entre o final de "O Retorno de Jedi" e o começo de "O Despertar da Força". Em outras palavras, "Aftermath" agora é a resposta oficial e canônica da Disney para a pergunta "o que aconteceu lá naquela galáxia muito, muito distante depois do fim de O Retorno de Jedi?". 

A história de "Aftermath" começa alguns meses depois do final de "O Retorno de Jedi". A Aliança Rebelde destruiu a segunda Estrela da Morte, Darth Vader e o Imperador Palpatine estão mortos e o Império está em frangalhos, com sua autoridade fragmentada pela galáxia. Uma Nova República começa a ser construída, tendo como Chanceler Suprema a líder rebelde Mon Mothma. Em busca de lideranças e combatentes imperiais escondidos, o veterano piloto Wedge Antilles sai em uma missão solitária de inspeção em uma série de planetas. Depois de passar por cinco outros planetas, Wedge chega a Akiva, onde a maior parte da trama de "Aftermath" se passa.

Rapidamente, Wedge percebe que o lugar está sendo utilizado como ponto de encontro para uma reunião de cúpula de forças imperiais remanescentes. Infelizmente, antes de conseguir transmitir essa informação para os rebeldes, Wedge é capturado. Rapidamente, a sua captura chega ao conhecimento de Norra Wexley, integrante da Aliança Rebelde que retorna a Akiva para reencontrar seu filho Temmin (um adolescente que aparece adulto depois em "O Despertar da Força", como piloto da rebelião, sob o nome Snap Wexley - e interpretado pelo ator Greg Grunberg). 

As circunstâncias e a presença dos imperiais acabam reunindo os Wexleys com o ex agente imperial Sinjir Rath Velus e com a caçadora de recompensas Jas Emari, colocando todos estes novos personagens em rota de colisão com os altos oficiais imperiais presentes em Akiva, liderados pela fria e calculista Almirante Rae Sloane (introduzida anteriormente no já mencionado livro "A New Dawn" de John Jackson Miller).

Esta é, em síntese, a trama de "Aftermath". A questão que realmente importa, no entanto, é: "e aí, o livro é bom?". E a resposta é, simplesmente, sim! Ao contrário, por exemplo, do já mencionado "Kenobi", que pecava por mais parecer uma trama qualquer forçadamente adaptada para incluir elementos do universo Star Wars, este "Aftermath" ostenta uma inegável quantidade de autêntico DNA da franquia. Do começo ao fim, ele constrói uma atmosfera e uma narrativa que soam perfeitamente como uma trama de Star Wars. 

A construção dos novos personagens é muito boa, a interação com velhos rostos conhecidos dos fãs funciona muito bem e o livro termina como uma promissora introdução a um novo capítulo "ponte" entre a trilogia de filmes dos anos 1980 e a nova trilogia iniciada em 2015 com "O Despertar da Força". Chuck Wendig acerta no tom da ação, do humor e dos diálogos, construindo um "Star Wars" dinâmico, divertido e convincente. Além disso, o livro traz bons momentos (embora curtos e rápidos) de reflexão política de certos personagens sobre os destinos da  galáxia e os desafios intermináveis da democracia. Reflexões e mensagens apropriadas e oportunas, sobretudo para o atual momento da política aqui no nosso mundo real. Como curiosidade, vale o registro de que "Aftermath" apresenta o segundo personagem abertamente gay do universo Star Wars, e o primeiro masculino (a primeira foi a Moff Delian Mors em "Star Wars: Lords of the Sith", de Paul S. Kemp, lançado também em 2015). Eu não vou contar quem é: leia e descubra! :)

Claro: nem tudo são flores em Aftermath. Ao longo das 403 páginas do livro, não espere, por exemplo, dar de cara com novas aparições de Luke Skywalker ou da Princesa Leia. A trama é essencialmente focada em personagens inteiramente novos. Apenas dois personagens consagrados da trilogia original de filmes dão as caras neste livro, e se trata literalmente de uma aparição relâmpago, que começa e termina em cinco páginas. É mais um "teaser" do que qualquer outra coisa. 

De resto, alguns coadjuvantes da trilogia clássica, como Mon Mothma, Wedge Antilles e o General Ackbar, também se fazem presentes. Mas é importante que o leitor tenha em mente que, neste ponto, esta nova trilogia "Aftermath", iniciada pelo livro de mesmo nome, se mostra fundamentalmente diferente da antiga trilogia Thrawn: enquanto esta funcionava como uma continuação de "O Retorno de Jedi" focada sobretudo em Luke, Han Solo e Leia, a nova trilogia "Aftermath" (pelo menos no que diz respeito a este primeiro livro) se mostra mais preocupada em apresentar novos personagens do que em focar no clássico trio de heróis dos filmes originais.

Apesar da ausência do amado mestre Luke, "Aftermath" é um Star Wars sólido e divertido, que abre às portas para uma trilogia de livros com muito potencial. Estou curioso pelos próximos, que já estão no mercado: a sequência "Life Debt" foi lançada em 2016 e a conclusão "Empire's End" em 2017. Ambos já estão na minha lista de próximas leituras.

O Caveira recomenda. E que a Força esteja com você!