quarta-feira, 30 de março de 2022

O Caveira resenha: URBAN WARRIORS (1987)

 


Para começo de conversa, quero deixar claro que não sou um novato quando o assunto é cinema italiano oitentista de ação pós-apocalíptica. Já tive o prazer de assistir várias das melhores pérolas deste gênero de gosto tão duvidoso, dentre as quais destaco 2019 - AFTER THE FALL OF NEW YORK, 1990 - THE BRONX WARRIORS, ESCAPE FROM THE BRONX, KERUAK - O EXTERMINADOR DE AÇO e ENDGAME

Estou ciente das principais falhas comuns entre as produções italianas daquele gênero e época, como pobreza de orçamento, roteiros rocambolescos e caráter derivativo em relação a produções norte-americanas referenciais como THE WARRIORS, ESCAPE FROM NEW YORK e MAD MAX 2. Conheço os defeitos, mas adoro essas "trasheiras" mesmo assim.

Dito isso, passo a esclarecer que este Urban Warriors é trash até para os padrões do cinema italiano de ação pós-apocalíptica dos anos 1980. Não acredita? Então confira esta resenha e tire suas próprias conclusões.

                                     
Urban Warriors, dirigido por Giuseppe Vari, foi lançado em 1987. Na trama, três técnicos, cientistas, engenheiros ou qualquer coisa do tipo estão trabalhando em um laboratório/instalação militar subterrânea. De repente, eles perdem todo o contato com a superfície e o estabelecimento fica completamente sem energia elétrica. Eles tentam sair do lugar, mas uma parte da estrutura sofre um desabamento, tornando impossível o acesso à saída e prendendo o trio no local. Depois de uma longa caminhada por túneis subterrâneos, eles acabam encontrando uma saída alternativa e finalmente chegam à superfície ... apenas para descobrir que uma guerra nuclear transformou tudo nas redondezas em um deserto desolado. Embora tal fato represente um choque para os personagens naquele momento, não há aqui nenhum "twist" para o espectador, que no começo do filme é apresentado a uma sequência de imagens de explosões nucleares misturadas com atividades vulcânicas (?), estragando qualquer possibilidade de surpresa.

O mundo pós-apocalíptico encontrado pelos protagonistas é bastante singular. Não vemos ruínas de prédios, nem destroços de veículos, nem corpos ou sinais de destruição urbana. Os "heróis" dão de cara com uma paisagem deserta de um lado, mas com vegetação preservada ao fundo (que explosão nuclear é essa que faz uma cidade desaparecer mas que preserva a grama?!?) e com duas estruturas intactas no horizonte. A primeira estrutura parece um conjunto de prédios sofisticados perfeitamente preservados. A outra parece uma precária instalação industrial abandonada. Para onde o trio de gênios da ciência resolve ir? Claaaaro, para o parque industrial inóspito! Fuck logics


No pátio industrial abandonado, os intrépidos sobreviventes encontram alguns alimentos enlatados e garantem um bom jantar pós-holocausto nuclear. Você poderia imaginar que, na vida real, três pessoas passando por uma experiência traumática dessas estariam simplesmente em choque e incapazes de comer ou dormir, não é mesmo? Bom, mas isso não se aplica para os cabras machos de Urban Warriors! A poeira nuclear ainda nem baixou e o nosso trio de heróis só pensa em dormir, comer, tomar cervejas e fazer piadas. É sério, eu juro! Os "heróis" lidam com o fim do mundo com a indiferença de alguém que foi pego de surpresa pelo imprevisto de um pneu furado ou de um celular sem bateria. Isso é o que eu chamo de um mindset otimizado para o pós-apocalipse!
 
                                              

Depois de umas cervejas e de um banquete de comida enlatada, o trio resolve dormir de novo (só para esclarecer: antes de chegarem à superfície, algumas horas antes disso, eles tinham dormido nada menos do que oito horas dentro da instalação subterrânea). Esses sujeitos são narcolépticos ou o quê? Nem filhote de gato dorme tanto assim!

                                                 

Depois da segunda noite de sono (em vinte minutos de filme!), o trio mais zen e relax que o fim-do-mundo já viu lida com uma sequência alarmante de novos acontecimentos. Primeiro, um dos cientistas se afasta dos outros para investigar um ruído na rua e desaparece. Posteriormente, seus colegas encontram apenas a cabeça do sujeito. Para variar, eles lidam com este chocante horror de forma aparentemente tranquila e indiferente - afinal de contas, o que é um amigo decapitado para quem lida de boas com o apocalipse nuclear, não é mesmo?

                                            

Em seguida, um dos cientistas encontra uma gravação em áudio feita por um desconhecido sobrevivente da guerra nuclear. Na gravação, a pessoa afirma que a radiação não apenas matou quase todo mundo como também causou algum tipo de mutação nos sobreviventes, tornando-os violentos e animalescos.

Peraí um pouco. Vamos tentar entender isso aí. Os caras estavam numa instalação subterrânea quando a guerra nuclear estourou. Eles levaram pouco mais de oito horas para chegar na superfície (sendo que passaram a maior parte deste tempo dormindo). Depois caminharam mais algumas horas e dormiram mais uma noite (depois de uma farra com cervejas e comida enlatada). Mas então quer dizer que o mundo acabou há menos de 24 horas e a civilização já foi substituída por um neobarbarismo estilo Mad Max, com maníacos enlouquecidos caçando outros sobreviventes de forma selvagem? E não apenas o mundo virou uma selva canibal em questão de poucas horas como deu tempo até de alguns sobreviventes registrarem o ocorrido em gravações de áudio? Isso aí é o "roteiro" de Urban Warriors?

                                           

Sim, é isso aí mesmo. Acredite se puder. Ah, e olha só que coisa curiosa: a radiação "enlouqueceu" parte dos sobreviventes, transformando-os em psicopatas homicidas sanguinários, mas não gerou nenhum tipo de lesão física aparente em ninguém! Que radiação mais diferentona esta, não é mesmo? Estou sendo irônico, é claro, pois fica evidente que a ideia da "radiação que afeta o psicológico mas não afeta o físico" foi apenas uma maneira de os realizadores deste filme pouparem uns trocados.

                                               

Mas voltemos à trama. Depois de tudo isso, os dois cientistas sobreviventes começam a ser ferozmente atacados por uma gangue de maníacos mutantes neobárbaros e, logo em seguida, uma violenta perseguição automobilística tem início (ohhhhh, quem poderia imaginar que isso iria acontecer em um clone italiano de Mad Max 2, né?). Tiros são trocados, motocicletas são espatifadas, mas a dupla de heróis remanescentes sobrevive. Então, entre uma troca de ideias e outra, eles chegam à conclusão de que nem todos os sobreviventes devem ter virado psicopatas homicidas e que devem ter sobrado algumas pessoas normais por aí em algum lugar. A dupla resolve procurar estes sobreviventes "do bem". Para tanto, eles elaboram o plano mais genial de todos os tempos: os dois resolvem SE SEPARAR para realizar as buscas!!! Fuck logics parte 2 - A Missão!!!


Não é brilhante? Afinal de contas, existe jeito melhor de encarar uma selva urbana pós-apocalíptica, repleta de maníacos tornados insanos por radiação nuclear, do que estando SOZINHO?

Esquadrão Classe Ai-que-merda!

Nestas idas e vindas, mais um dos cientistas é morto pelos neobárbaros atômicos, como já seria de se esperar. É isso que dá quando pesquisadores de laboratório subterrâneo resolvem brincar de Mad Max. Assim, dos três protagonistas do começo do filme, apenas um - Brad - sobrevive. "Coincidentemente", Brad é o mais fotogênico e galã do trio - tanto é que, no pôster do filme, ninguém fez questão de incluir nenhum dos outros dois cientistas. Pois é, o mundo não era fácil para os nerds nos anos 1980 - ainda mais quando rolava guerra atômica!

A essa altura do filme, já tivemos de tudo: guerra nuclear, motoqueiros mutantes, perseguições automobilísticas, trocas de tiros, dois cientistas trucidados, etc. Para uma plena e completa experiência trash/exploitation italiana oitentista, é claro que falta só mais uma coisa: nudez gratuita. É aí que uma tal de Julia aparece do nada no caminho de Brad e acaba seduzindo ele.

                                                   

Com sexo, cerveja e comida enlatada, Brad provavelmente deve ter pensado que o apocalipse nuclear até que não é lá tão ruim assim. Mas, como pão radioativo de pobre sempre cai com a manteiga atômica virada para o chão, Julia se revela uma integrante da gangue dos facínoras das estradas e entrega Brad nas mãos da horda de maníacos. Infelizmente para a ladina sirigaita, um dos trogloditas resolve matar ela ali mesmo, a troco de nada, em cinco segundos, porque sim. Ninguém liga.

                                               

Aprisionado pelos aloprados radioativos, Brad conhece Angela, que também escapou dos efeitos da radiação. Na sequência, Brad é julgado e condenado por um tribunal neobárbaro de pretensos representantes do povo. Mais uma vez, é notável ver como os sobreviventes malucos da guerra nuclear não apenas conseguiram se manter vivos como, também, criaram instituições, procedimentos jurídicos e conjuntos inteiros de novos costumes e regramentos sociais - tudo isso em questão de uns poucos dias. É muita eficiência! Me faz lembrar daquele antigo episódio de South Park em que os habitantes da cidade ficam presos dentro de um prédio e acabam recorrendo ao canibalismo para sobreviver, apesar do fato de serem libertados em questão de quatro ou cinco horas.

                                        

De volta ao filme. Depois de uma das piores cenas de "tribunal" da história do cinema, felizmente vemos nosso herói Brad recebendo ajuda de uma das integrantes da gangue e fugindo do seu cativeiro, levando Angela junto. O recém formado casal tem sucesso no confronto final com a gangue dos psicopatas atômicos e os dois sobreviventes partem juntos em busca de um futuro de esperança - e era isso: The End !

                                                     

Como você pode perceber, Urban Warriors é ruim. Indefensavelmente ruim. A produção é de uma pobreza franciscana, as atuações são amadoras, os diálogos são risíveis, as cenas em ambientes escuros são simplesmente um breu total, a ação é pobre e limitada e o pôster é muito mais legal e produzido do que o filme em si. Ao mesmo tempo, fãs do gênero invariavelmente irão se divertir com o humor involuntário e com as limitações técnicas dessa produção barata. 

                                          

Eu já assisti alguns filmes de orçamento magérrimo dentro do estilo sci-fi/action distópico dos anos 80 - como, por exemplo, o paupérrimo Endgame. Ainda assim, devo admitir que, em termos de pobreza e falta de orçamento, Urban Warriors supera qualquer coisa que eu já tenha visto até hoje neste gênero. Há algo de engraçado e divertido em ver Urban Warriors e perceber como é possível fazer um filme de ação distópica pós-apocalíptica com praticamente nenhuma verba. Sob este aspecto, pela ambição temática na comparação com a pobreza de orçamento e pelo que consegue entregar apesar da carência de recursos, de atores decentes e de um roteiro competente, fica difícil não sentir uma certa admiração e respeito pelo charme cara-de-pau de Urban Warriors.

Não se faz mais filmes assim. (In)felizmente? 

   


segunda-feira, 14 de março de 2022

O Caveira resenha: ALLIGATOR (1980)

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Esse aqui era figurinha recorrente na programação do SBT nos anos 80. Não sei se cheguei a ver o filme inteiro na infância, mas lembro bem de ter visto pelo menos algumas partes nas várias reprises da época. Nunca mais tinha cruzado com esse filme em lugar nenhum. Há alguns dias, vi ele pela primeira vez em cerca de 30 anos.

Contrariando qualquer expectativa razoável, o filme é divertido, bem produzido, tem ótimo ritmo e é muito acima da média para os padrões da época.

Alligator é dirigido por Lewis Teague (que tem no currículo a ótima antologia de horror Cat's Eye, de 1985, bem como o clássico oitentista The Jewel of the Nile, lançado naquele mesmo ano).

Na trama, um filhote de crocodilo é atirado na privada, vai parar no esgoto e começa a se alimentar de lixo tóxico. Doze anos depois, transformado em um mutante monstruoso, o bichão começa a tocar o terror em Chicago. 


Para um filme de crocodilo assassino, o resultado geral impressiona. Alligator acerta bastante no tom, não se leva excessivamente a sério e mistura doses equilibradas de suspense, terror e alívio cômico (até com uma pitada de romance cafona).

Destaques para os efeitos práticos da criatura, que ficaram bastante convincentes, e para a atuação de Robert Forster (mais conhecido pelo público contemporâneo por sua participação na série Breaking Bad).

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Estou realmente convencido de que Alligator é tão bom quanto um filme de crocodilo assassino pode ser. Tudo bem, ele não é mais tão convincente quanto nos anos 1980, mas ainda é uma diversão garantida. Dê um jeito de ver!

     

sexta-feira, 11 de março de 2022

O Caveira resenha: THE GUARDIAN ("A Árvore da Maldição"), de 1990

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Vi "A Árvore da Maldição" pela primeira vez na Globo, no começo dos anos 1990. Admito que, na época, achei o filme um pouco assustador (especialmente nas cenas da árvore maldita). Revendo agora, quase trinta anos depois, sobra muito pouco - ou absolutamente nada - para elogiar.

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Na trama: um casal contrata uma babá para cuidar do filho recém-nascido e acaba descobrindo que a atenciosa jovem age movida por forças sobrenaturais.

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Dirigido por William Friedkin (célebre pelos clássicos "O Exorcista" e "Operação França"), The Guardian tem um ótimo ponto de partida e sua premissa sinistra poderia ter rendido um filmão.

Infelizmente, o filme fica devendo em ritmo, edição, atmosfera, som e nas atuações fracas (só a vilã, interpretada por Jenny Seagrove, se salva). O resultado é uma mediocridade do começo ao fim. O diretor renega o filme até hoje e já admitiu publicamente que ele "não funciona".

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Em tempo: esse filme saiu em 1990 e, dois anos depois, o Iron Maiden apareceu com essa ideia de "árvore maldita" na capa do lendário álbum Fear of the Dark. Será que a banda se inspirou nesse filme fraquinho ou será que foi só coincidência?

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