quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Contos de Horror do Caveira : "Betina Saiu Dessa Vida"


BETINA SAIU DESSA VIDA

Aquela era uma cidade pequena e interiorana, e nela o prazer tinha nome. Chamava-se Betina. Aos vinte e dois anos de idade, a garota alta, loira e dona de um espetacular par de seios já tinha levado ao delírio boa parte dos homens da cidade e de quatro ou cinco municípios vizinhos, terras nas quais a sua reputação lhe precedia, normalmente resumida por algum rapaz afoito, entre um gole de cerveja e outro, através de alguma frase como “Oh, cara, esse mulherão vale cada centavo!”.

A clientela de Betina estava satisfeita com ela, e não menos realizada estava ela com a vida que levava. Suas amigas suavam, dia após dia, atrás de balcões de lojinhas de roupas, ou mofando em escritórios tediosos, para terminar o mês com um pobre salário mínimo nas mãos. Betina acordava todos os dias depois do meio-dia e quase não tinha horários, e ao longo de um mês ganhava quinze ou vinte vezes mais do que a maioria de suas amigas.

E, que fique entre nós, ela gostava do que fazia.

Era muito, muito raro ela ter que fingir um orgasmo para seus clientes, mesmo quando se tratavam de homens roliços de meia idade. Betina simplesmente sentia prazer quando um homem se divertia dentro de suas entranhas, especialmente se o sujeito tivesse uma conta bancária proporcional à libido.

Nem os homens que a maltratavam deixavam ela com medo. A violência até a excitava, de certa maneira. Suas manhãs de sono, após o trabalho noturno, eram recheadas de sonhos eróticos em que se via nua, em calabouços, masmorras, cemitérios e cenários semelhantes, frequentemente sendo violada por homens grotescos. Várias vezes, a lembrança dessas imagens a excitava no meio de um programa.

Certa noite, Betina estava em seu apartamento quando o telefone tocou. Ela atendeu e reconheceu a voz de Rodrigo, dono de uma pequena casa noturna. Rodrigo – vulgo “Digo” - ligava para Betina toda vez que sentia vontade de ir para a cama com uma mulher bonita e vinte anos mais nova. Ou seja, basicamente o tempo todo.

- Essa noite vou querer a Pati – falou Rodrigo.

- Amor, vou ficar te devendo essa – respondeu Betina, com desdém.-A Pati não aparece no apartamento há quatro dias.

- Ué, aonde será que ela anda?

- Ai, Digo, como é que eu vou saber? Não sou mãe dela. Não me espantaria de saber que ela arranjou um velho rico e sumiu com ele. É bem capaz de ela estar agora de biquini numa bóia, na piscina de alguma mansão, desfilando na frente de algum tomador de Viagra.

Rodrigo riu com a idéia. Ficou desapontado, mas optou por marcar um horário com Betina para aquela madrugada.

Depois que Rodrigo desligou, Betina ficou absorta em seus pensamentos. Pati era uma grande amiga sua. Era, também, outro nome famoso entre os consumidores de corpos locais. Ambas moravam juntas, no mesmo apartamento pequeno e desarrumado. Não raras vezes, seus clientes solicitavam as duas juntas.

Apesar da brincadeira, Rodrigo tinha tocado num assunto sério. Betina estava, sim, preocupada com a amiga. Era normal passarem uma ou até duas noites fora, mas Pati estava sumida a quatro dias, e isso nunca tinha acontecido antes. Teria Pati largado “essa vida”, como elas se referiam ao próprio metiê? Ela comentava com Betina que tinha vontade de parar, algumas vezes. Mas nunca parecia ser uma determinação séria.

Meia hora depois do telefonema de Rodrigo, Betina estava saindo do banho quando o telefone tocou novamente. Ela atirou a toalha em cima da cama e atendeu. A voz era de um homem, como já era de se esperar, mas nenhum que Betina conhecesse. Ela tentou parecer sedutora para o novo cliente, fazendo uma voz sexy, mas o homem parecia nervoso e apressado. Ele queria encontrá-la ainda naquela noite, atrás da igreja. Betina prometeu que estaria lá, às onze horas. O homem pediu para ela bater na porta dos fundos e esperar por ele.

“Sem dúvida, mais um inseguro com ejaculação precoce que está saindo com uma garota de programa pela primeira vez na vida”, pensou Betina, rindo enquanto secava os cabelos.

Mais tarde, Betina saiu a pé para encontrar seu novo freguês, já que a igreja não era muito longe de sua casa. Ela estava com um vestido vermelho curtíssimo, deixando à mostra as longas pernas cujos músculos eram realçados pelo salto alto. Metade de seus robustos seios saltava para fora do indecente decote. Betina gostava de transformar clientes novos em permanentes, e o estímulo visual adequado sempre funcionava.

Ela chegou então na igreja e deu duas batidas na porta dos fundos, conforme combinara com o homem. “Quem será ele?”, pensava ela. A rigor, nenhum funcionário eventualmente tarado da paróquia teria dinheiro para pagar o cachê dela. Para espanto e absoluto constrangimento da garota, um rosto conhecido abriu a porta. O padre Cláudio, um homem na casa dos cinqüenta anos, pediu para ela entrar.

- Eu a esperava – disse o padre.

- Bem, EU não o esperava – respondeu Betina, sorrindo apesar da surpresa. – Espero que não tenha me chamado para um sermão – brincou.

- Não, de forma alguma. Suba as escadas e me espere em meu quarto. Subirei em poucos instantes.

Betina riu. Seria a sua primeira vez com um padre. Ela era experiente “nessa vida”, mas essa situação era por demais inusitada mesmo para ela. O padre Cláudio, além de homem religioso, a conhecia desde pequena. Ela jamais poderia imaginar que, por trás daquele semblante sério e discurso carola, havia um pervertido sexual. Estava rindo sozinha enquanto adentrava o simplório quarto do padre.

Ela largou sua bolsa sobre um pequeno criado mudo, sentou-se na cama velha do pequeno quarto e começou a se despir. Já inteiramente nua, resolveu esperar o tarado clérigo vestida a rigor, com uma das batinas do padre. “Betina de batina”, pensou ela, rindo sozinha mais uma vez. “Onde será que o padreco guarda seus vestidinhos?”, pensou, já visualizando de pronto a resposta: um grande e velho armário do outro lado do quarto. Bonito, mas antigo, fora de moda. O tipo do móvel que você espera encontrar na casa de idosos, com aquela aparência de que foram derrubadas quinze árvores só para fazê-lo, e necessários oito homens só pra trazer o móvel até ali.

Betina espiou pela porta para ver se o padre já estava subindo. Nenhum barulho. Caminhou rapidamente então para o velho armário, contando com o tempo para encontrar uma batina, vesti-la e esperar seu mais novo cliente na cama. Ela abriu a enorme porta do armário num movimento rápido, e dali de dentro veio imediatamente ao chão o corpo nu de sua amiga Pati, já semidecomposto, com os vítreos olhos abertos e secos e com um reluzente machado ensanguentado enterrado na cabeça.

Imobilizada pelo terror e nauseada ao ponto de perder os sentidos, Betina subitamente ouviu um estrondoso chute na porta do quarto e virou-se para ver o padre Cláudio caminhando rapidamente em direção a ela, nu da cabeça aos pés, com um machado nas mãos.

- É hora do arrependimento e da punição. Vamos comer, meu bom Deus!!!

Algumas horas depois, o celular na bolsa da garota tocou. Era o Digo, furioso, querendo saber por que ela não havia aparecido para o programa que combinaram. Ele não tinha a menor idéia de que jamais iria para cama com Betina novamente.

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